quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Se eu Fosse um Padre

Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
- muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...

Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma
... a um belo poema - ainda que de Deus se aparte -
um belo poema sempre leva a Deus!

Mário Quintana



Metáfora
Antítese 

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Canto IV – Episódio O Velho do Restelo

90  

"Qual vai dizendo: —" Ó filho, a quem eu tinha
Só para refrigério, e doce amparo
Desta cansada já velhice minha,
Que em choro acabará, penoso e amaro,
Por que me deixas, mísera e mesquinha?
Por que de mim te vás, ó filho caro,
A fazer o funéreo enterramento,
Onde sejas de peixes mantimento!" —


91  

"Qual em cabelo: —"Ó doce e amado esposo,
Sem quem não quis Amor que viver possa,
Por que is aventurar ao mar iroso
Essa vida que é minha, e não é vossa?
Como por um caminho duvidoso
Vos esquece a afeição tão doce nossa?
Nosso amor, nosso vão contentamento
Quereis que com as velas leve o vento?" — 
 

Paráfrase - O Exame

Não há trabalho para mim devido à minha condição de criado. Não fico me expondo, tenho medo; sequer me junto aos outros na fila, o que é uma das causas de minha desocupação; também, ela pode não ter nada a ver com isso; o importante é que eu não sou chamado para a prestação de serviços; alguns outros foram chamados e não fizeram mais gestões que eu; talvez nem tenham sentido o desejo de serem chamados, o que eu senti, às vezes, muito intensamente.
Permaneço, portanto, no catre, no quarto dos criados. Olhando fixamente para as vigas do teto. Durmo, acordo e volto a dormir. Tem vezes que vou até a taverna onde servem cerveja azeda; algumas vezes, por apetite, viro o copo, mas volto a beber novamente. Gosto de sentar-me onde possa olhar para as janelas de nossa casa; posso estar enganado, pois, alguém falou certa vez, e a fachada o confirma. Só de vez em quando as janelas são abertas, e quem faz isso é um criado. São corredores onde não se pode ser surpreendido. Além disso, não conheço tais criados; dormem em outro lugar; não em meu quarto.
Ao chegar à hospedaria, uma vez, um hóspede já ocupava meu posto de observação; quis sair em seguida, não me atrevi a olhar para onde ele estava. Então o hóspede me chamou, nisso, percebi que era um criado que eu já conhecia, o vi alguma vez em alguma parte.
- Por que estás querendo fugir? Senta-te aqui e bebe comigo, por minha conta.
Perguntou-me alguma coisa logo após eu ter sentado, porém, não consegui responder-lhe, já que não compreendia as perguntas. Disse, então:
- Pode aborrecer-te talvez, o fato de ter-me convidado. Vou-me embora.
Quis levantar, mas ele me manteve em meu lugar ao estender a mão sobre a mesa.
- Fique! - disse ele. Era somente um exame no qual a aprovação depende de não responder às perguntas. 

Conto - O Exame


Sou um criado, mas não há trabalho para mim. Sou medroso e não me ponho em evidência; nem sequer me coloco em fila com os outros, mas isto é apenas uma das causas de minha falta de ocupação; também é possível que minha falta de ocupação nada tenha a ver com isso; o mais importante é, em todo caso, que não sou chamado a prestar serviço; outros foram chamados e não fizeram mais gestões que eu; e talvez nem mesmo tenham tido alguma vez o desejo de serem chamados, enquanto que eu o senti, às vezes, muito intensamente.
Assim permaneço, pois, no catre, no quarto de criados, o olhar fixo nas vigas do teto, durmo, desperto e, em seguida, torno a adormecer. Às vezes cruzo até a taverna onde servem cerveja azeda; algumas vezes por desfastio emborquei um copo, mas depois volto a beber. Gosto de sentar-me ali por que, atrás da pequena janela fechada e sem que ninguém me descubra, posso olhar as janelas de nossa casa. Não se vê grande coisa; sobre a rua, dão, segundo creio, apenas as janelas dos corredores, e além do mais, não daqueles que conduzem aos aposentos dos senhores; é possível também que eu me engane; alguém o sustentou certa vez, sem que eu lho perguntasse, e a impressão geral da fachada o confirma. Apenas de vez em quando são abertas as janelas, e quando isso acontece, o faz um criado, o qual, então, se inclina também sobre o parapeito para olhar para baixo um instantinho. São, pois, corredores onde não se pode ser surpreendido. Além do mais não conheço esses criados; os que são ocupados permanentemente na parte de cima, dormem em outro lugar; não em meu quarto.
Uma vez, ao chegar à hospedaria, um hóspede ocupava já o meu posto de observação; não me atrevi a olhar diretamente para onde estava e quis voltar-me na porta para sair em seguida. Mas o hóspede me chamou e, assim, então, percebi que era também um criado ao qual eu tinha visto alguma vez e em alguma parte, embora sem ter falado nunca com ele até aquele dia.
- Por que queres fugir? Senta-te aqui e bebe. Eu pago.
Sentei-me, pois. Perguntou-me algo, mas não pude responder-lhe; não compreendia sequer as perguntas. Pelo menos eu disse:
- Talvez agora te aborreça o fato de ter-me convidado. Vou-me, pois.
E quis erguer-me. Mas ele estendeu a mão por cima da mesa e me manteve em meu lugar.
- Fica-te!, disse. Isto era somente um exame. Aquele que não respondesse às perguntas está aprovado no exame.
Franz Kafka

Relato de um médico

Deixo aqui o relato de um médico que participou de uma pesquisa científica holandesa sobre EQM, publicada em um artigo na renomada revista médica internacional, The Lancet, em dezembro de 2001: “Durante o plantão noturno na Unidade coronariana, a ambulância trouxe um paciente de 44 anos, em coma, cianótico (extremidades arroxeadas) e em parada cardíaca. Ele recebeu ventilação artificial, massagem cardíaca e desfibrilação. Quando fomos intubá-lo, a sua dentadura deslocou-se para fora da boca. Eu removi sua dentadura superior e a coloquei sobre o carrinho de atendimento. Continuamos nos procedimentos de ressuscitação cardiopulmonar que foi bastante prolongado. Uma hora e meia após, ele foi transferido para a UTI, ainda comatoso, intubado e em ventilação artificial. Após uma semana eu me encontrei novamente com o paciente, e ao ver-me, ele falou apontando para uma funcionária: “Aquela enfermeira sabe onde está minha dentadura”. Após eu me mostrar espantado, ele explicou: “Sim, você estava lá quando a ambulância me trouxe para o hospital e você tirou a minha dentadura da boca e a pôs em cima do carrinho”. Eu fiquei particularmente assombrado, porque me lembrei do que aconteceu enquanto o paciente estava em coma profundo, com o coração parado e fazíamos as manobras para reanimá-lo. Após questioná-lo, ele informou que vira a si próprio na maca, de uma perspectiva de cima, percebeu como enfermeiras e médicos estavam ocupados com a sua recuperação. Ele descreveu corretamente e, em detalhes, a pequena sala em que fora atendido, bem como o aspecto das pessoas presentes. Disse que tentou desesperadamente e sem sucesso nos mostrar que ainda estava vivo e que deveríamos prosseguir com as manobras de ressuscitação. Ele está profundamente impressionado pela sua experiência e disse que não tem mais medo de morrer. Quatro semanas depois ele teve alta hospitalar em boas condições de saúde”.(Fonte: jornalista e escritor Marcel Souto Maior, autor do livro As Vidas de Chico Xavier foi um dos consultores).